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A resistência Guarani

A resistência Guarani

A presença guarani se estendia sobre uma imensa região, desde o Pantanal até o oceano Atlântico, abrangendo os atuais estados do Rio Grande do Sul, de Santa Catarina, do Paraná, de São Paulo e do Mato Grosso do Sul, além de partes da Bolívia, do Paraguai e da Argentina.

Do ponto de vista étnico e linguístico, os Guarani em tudo se assemelham aos Tupi do litoral dos atuais Sudeste e Nordeste do Brasil.

Contudo, ao longo da história, os portugueses criaram imagens muito diferentes desses dois povos. Enquanto os Tupi ganharam a fama de terríveis guerreiros antropófagos que impunham medo aos europeus, os Guarani (chamados inicialmente de Carijó) foram, em geral, rotulados como pacatos agricultores sedentários. Segundo essa ideia, os indefesos Guarani teriam sido cruelmente perseguidos e escravizados pelos bandeirantes paulistas. Para salvar a própria vida, os indígenas teriam se convertido ao cristianismo e se submetido aos padres jesuítas, que os reuniram em aldeias e missões disciplinadas e pacíficas.

Entretanto, a historiografia recente tem demonstrado que essa concepção é equivocada.

 

Uma nova visão

Segundo o historiador John M. Monteiro, "[...] ao contrário dos Tupi da costa, a guerra guarani tem suscitado pouca atenção dos estudiosos[...]. Do mesmo modo, a antropofagia guarani aparece com pouco destaque".

Para Monteiro, isso ocorre por causa do destaque dado pelos estudiosos à religião como unificador da cultura guarani, comparado ao acentuado interesse que os pesquisadores demonstram pela guerra entre os Tupinambá. Dessa forma, é criada a impressão de que os Guarani eram mais pacíficos e sedentários do que os Tupinambá.

Entretanto, as fontes históricas do século XVI indicam justamente o contrário. Segundo o relato do viajante alemão Ulrich Schimdl, que conhecia também os grupos tupi da costa: "não há nação que seja melhor para se ocupar com as guerras por terra e que pode aguentar mais que os ditos carijós".

Os Guarani habitavam aldeias cercadas de paliçadas, similares às tupis. Esse seria um indício de constantes confrontos com inimigos.

Um dos maiores adversários dos Guarani eram os Paiaguá, com os quais eles compartilhavam o território do alto rio Paraguai.

Como alerta John M. Monteiro, outro aspecto em geral esquecido da cultura guarani é a prática da antropofagia. Da mesma forma que os Tupi, os Guarani executavam e comiam os prisioneiros de guerra em rituais mágicos.

 

Nem passivos, nem sedentários

As constantes guerras entre inimigos tradicionais, a referência à antropofagia e às aldeias com paliçadas parecem aproximar a situação pré-colonial dos Guarani à dos Tupi da costa. Além disso, pesa contra a ideia de maior sedentarização dos Guarani o mito da "terra sem mal".

De acordo com o antropólogo espanhol Bartolomeu Meliá, o conceito guarani de yvy marã ey (geralmente interpretado como "terra sem mal") significava "solo intacto, que não foi edificado", ou seja, terra virgem.

Assim, a busca por novos territórios, que propiciassem melhores condições de sobrevivência, motivava as migrações e os deslocamentos dos Guarani, desmitificando o caráter de grupo mais sedentarizado.

 

#SAIBA MAIS

- Antropófago: Que come carne humana. Indivíduo que come carne humana; canibal.

 

 

 

 

 

 

 

Os Carijó (Guarani), gravura da obra de Ulrich Schmidl, 1559. Nesta imagem podemos observar ao fundo a aldeia cercada de paliçada. A abundância de animais e frutas é uma alegoria do autor ao mito da "terra sem mal".

Tancredo Professor . 2024
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